Dois episódios extremamente significativos resultaram como marca das "marchas contra a corrupção" que a Rede Globo, por seu jornal, rádios e TVs, tentou mobilizar em várias capitais do País, no feriado do dia 12: a participação social bem menor do que a esperada, e a expulsão de pelo menos dois militantes políticos orgânicos – o deputado Paulo Rubem, do PDT, em Pernambuco; e um portador da bandeira do PSOL, que acompanhava o senador Randolfe, segundo seu relato publicado.
Difícil imaginar que manifestação realmente identificada com as bandeiras propostas possam ter nesses dois exemplos os seus inimigos a combater.
O Globo, em busca de explicações para o reconhecido fracasso, chegou a recorrer a cientistas políticos que declararam, delicadamente, não haver condições para impor "primaveras", pois estas só têm sentido quando organizadas de forma espontânea. Faltou, e certamente os entrevistados a ela não se referiram por limites de delicadeza, citar a principal razão do fracasso a despeito de todo o empenho anterior na promoção do fato que queriam transformar em notícia: a Rede Globo não tem credibilidade social para mobilizar uma luta política de viés progressista. Principalmente, quando essa luta política usa valores que nunca foram do espectro de característica de suas emissoras de rádio e tv, ou de seu jornalão.
Os que aceitaram a convocação - com as exceções normais de qualquer estatística - estavam na verdade atendendo à convocação para os passos iniciais de uma fortemente ideologizada campanha de despolitização da Política. Estavam sendo integrados a um Partido com objetivos claros: através de bandeiras corretas, desqualificar a vida política organizada, e principalmente os Partidos da esquerda combativa, que não se rendeu nem se vendeu, para os quais tais bandeira são parte de um espectro amplo de lutas transformadoras. Um Partido que, longe de participar do processo eleitoral, visa exatamente o oposto - estimular o ceticismo e o desencanto que se espalha por boa parte da campo eleitoral opositor aos desmandos da direita tradicional, e da nova direita, onde a corrupção é prática permanente pela forma como privatiza a res publica.
Ou seja, a organização dos Marinho apostou forte na concepção lampeduseana do tudo mudar para que nada, qualitativamente, se transforme. Perdeu.
Mas não vai interromper sua batalha, porque o alvo é o processo eleitoral. No qual, em 2012, vai continuar apoiando Eduardo Paes, a despeito de tudo o que já se aponta de malfeito na produção dos megaeventos da Copa e das Olimpíadas. E no qual, em 2014, vai continuar dispondo de meios e formas para garantir a reeleição dos porta-vozes do sistema financeiro privado e dos ruralistas do agronegócio predador. E, para isso, precisa continuar desmobilizando quem neles não crê, para que não vote nos que realmente os representem, visto "serem todos farinhas do mesmo saco".
Vai continuar apostando em outra via. Em algo que recentemente iniciou, discretamente, mas também com objetivos claros: organização de debates temáticos de interesse público, sempre conduzidos pelos seus mais íntimos "colunistas" de política e economia, em auditório próprio ou em espaços públicos parceiros. Debates onde os participantes, atuando de forma monocórdica, variando apenas no brilho, defendem a mesma corrente neoliberal e privatista de organização da sociedade - na linha dos painéis william waack, da globonews. Debates que são anunciados com amplo rufar de tambores, para, na sequência, serem transformados em "opinião da sociedade civil", em coberturas de página inteira nas quais, nem de perto, se pretende dar espaço ao contraditório.
Não é certo que a operação "resulte", como dizem os chilenos. Nas ruas, certamente, estarão limitadas aos mesmos segmentos que, em épocas passadas, se mobilizavam nas "marchas com Deus e pela família", ou nas manifestações do CCC - comando de caça aos comunistas - e da famigerada TFP - tradição, família e propriedade. Jovens e senhoras da classe média reacionária e orgulhosas de sua alienada adesão ao senso comum.
Mas não devemos subestimá-la. Os instrumentos dessa mobilização são bem mais potentes dos que os dos partidos e movimentos sociais progressistas e democráticos, que vêem a necessidade da desconstrução do regime capitalista como um eixo fundamental na construção de um Novo Mundo.
Por isso, devemos estar atentos à necessidade de não embarcar na onda de desqualificação das disputas eleitorais em nome de uma crença divina nos "movimentos". Pois estes, sem a representação institucional, através de parlamentares e executivos engajados com a luta progressista, não produzem as alternativas que transformem em realidade as demandas sociais de mudança.
Milton Temer é jornalista
18 de out. de 2011
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