Com dores na coluna, a manicure Eni Rodrigues, 48, ficou seis meses com dificuldades para trabalhar, recorrendo apenas a remédios. "Fiz um raio X, mas não podia continuar o tratamento porque não conseguia a marcação. Fiquei impossibilitada de ter uma vida normal e também sem recursos para resolver o problema." Para ouvidora municipal de saúde, Edna Rodrigues, o que mais preocupa na demanda reprimida é o fato de a demora provocar um agravamento no quadro do paciente, causando prejuízos tanto para a família quanto para o Estado. Algumas pessoas chegam a desistir e procuram serviços particulares ou planos de saúde para continuarem o tratamento. No caso da contadora Maria Aparecida Novaes, 52, são cerca de cinco meses aguardando. Tempo suficiente para o prazo de carência do novo plano adquirido vencer e ela finalmente conseguir realizar os exames solicitados.
Em alguns casos, os usuários conseguem encontrar uma solução recorrendo ao HU ou ao Hospital Terezinha de Jesus. Foi o que fez a dona de casa Silvânia dos Santos, 50. "Sofro de síncope de vagal e, por causa disso, tenho desmaios repentinos e fiquei mais de um ano esperando para ser atendida. Como não consegui a consulta no SUS, fui para o Hospital Universitário."Essa também é uma alternativa que a Ouvidoria tem encontrado para tentar solucionar as demandas que chegam. "É bom poder contar com essas outras possibilidades, mas é importante também que o município cumpra o seu papel de oferecer cobertura em especialidades tão importantes", ressalta Edna.
Agravamento
O problema do longo tempo de espera não é recente na cidade. Em outubro de 2011, a Tribuna de Minas mostrou números semelhantes, cerca de 30 mil usuários estavam aguardando. A Secretaria de Saúde da antiga gestão atribuiu os dados aos 43 dias de greve dos médicos. Em uma tentativa de solucionar o impasse entre esses profissionais e a Prefeitura, a lei municipal 12.325 foi sancionada naquele mesmo ano e estabeleceu critérios para o cumprimento de 20 horas de jornada semanal de trabalho dos médicos e também reduziu o número de consultas para o mínimo de 12, no lugar das 14 pedidas anteriormente. O presidente do Sindicato dos Médicos, Gilson Salomão, acredita que o município mostrou sensibilidade ao aprovar a lei. Para ele essa foi a única forma de manter o sistema de saúde municipal funcionando, "caso contrário, ninguém trabalharia."
O secretário de saúde , José Laerte Barbosa, afirma ter conhecimento da atual realidade e aponta como principal desafio o de conseguir profissionais em especialidades que também estão em falta até na rede particular. "Neste caso não é um problema só do SUS é um problema do mercado. Vamos fazer um levantamento para avaliar as possíveis soluções. Por outro lado, tentaremos reorganizar o sistema com os profissionais que temos disponíveis e começar a resolver os problemas. Agregado a isso, ainda temos um grande número de médicos que adiantaram os pedidos de aposentadoria por causa da insatisfação, deixando o quadro mais defasado. Nesta gestão vamos fortalecer o diálogo com a categoria, pois sabemos que para trazer o médico não é necessário apenas oferecer um bom salário, é preciso dar estrutura", explica o secretário.
Para Ouvidoria, lei não beneficiou usuário
Depois de mais de um ano e meio de funcionamento da lei, a Ouvidoria de Saúde questiona a medida e diz que o usuário não foi beneficiado, pois a demanda reprimida por consultas e exames não diminuiu e o número de médicos trabalhando não aumentou. "É preciso questionar a eficácia da 12.325. Não estamos contra a categoria médica, mas a favor dos pacientes, que, como resultado final, perderam o número de atendimentos e continuam esperando", alerta Edna.A solução parece ainda mais longe quando consideradas as constantes reclamações da categoria médica, que ainda se diz desestimulada por baixos salários e más condições de trabalho."As exigências que foram impostas são uma maneira de buscar uma maior flexibilização da jornada de trabalho e quando não são cumpridas acabam por deteriorar ainda mais o sistema público de saúde", argumenta Gilson Salomão.
O Conselho Municipal de Saúde, junto com a Ouvidoria de Saúde, realizou um encontro, em novembro do ano passado, entre Secretaria de Saúde, Promotoria de Saúde e Ouvidoria para discutir a situação. Para o secretário executivo do conselho, Jorge Ramos, é preciso repensar as atuais condições de atendimento no SUS. " A redução da jornada dos médicos não é solução para o problema da demanda reprimida e também não resolve a questão da satisfação dos profissionais. O ideal seria o médico respeitar a portaria 1.101 do Ministério da Saúde, que sugere o tempo de 15 minutos por consulta."
A promotora de Saúde, Carolina Andrade, explica que a decisão de diminuição da jornada foi do poder executivo municipal, por isso está determinada somente para os médicos de Juiz de de Fora. "Existem profissionais do estado e da união que prestam serviços para a cidade e estão cumprindo a jornada determinada pela nova lei, entretanto eles não se enquadram nesta nova situação. Marcamos uma reunião com a nova administração municipal para levar essas questões e também dar conhecimento sobre a atual cenário e os compromissos firmados pelo município na área de saúde."
Mutirões como paliativo
A promotoria de saúde acompanha a situação e reconhece o problema da demanda reprimida. Uma das tentativas encontradas para diminuir a fila de espera foi a negociação com a Prefeitura para a realização de mutirões, feitos entre março e outubro de 2012. De acordo com informações da Secretaria da Saúde, 18.672 usuários foram contatados, por meio de um compromisso feito com o HU, com o Hospital Terezinha de Jesus e com a Santa Casa. Desses, 13.300 fizeram os procedimentos, os demais, por um motivo ou outro, não se interessaram em realizá-los.Para a promotora de saúde Carolina Andrade a medida foi uma maneira de apagar o incêndio, mas não solucionou a questão. "É um problema difícil de se resolver. A carreira do médico não está estruturada no município e o profissional se sente desestimulado. Por outro lado,o tem a demanda da população sem atendimento."Carolina acredita que a solução passa pela revisão do papel da carreira do médico e previsão de progressão, junto com um esforço da Prefeitura para melhorar as condições de trabalho. "O Ministério Público continua acompanhando de perto e não descarta a instalação de novos procedimentos."
FONTE: TRIBUNA DE MINAS.COM
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