Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
Foi criado nesta segunda-feira (24/05), via portaria do Ministério da Educação (MEC), um concurso para avaliar professores interessados em trabalhar na rede pública. A primeira edição do chamado Exame Nacional de Ingresso na Carreira Docente deverá ocorrer em 2011 e será voltada a educadores da educação infantil e do 1º ao 5º ano do ensino fundamental.
Será um serviço que o Inep/MEC prestará às redes municipais e estaduais de Educação para seleção de novos professores, suprimindo a necessidade de realização de concurso público – bastaria publicar um edital de concurso público e usar a nota do Exame como critério para seleção. Funcionaria de forma semelhante ao ENEM: um exame único que poderia ser utilizado para o ingresso em diferentes redes de ensino em todo o país.
De acordo com a portaria publicada no Diário Oficial da União, o exame constituiu uma “avaliação de conhecimentos, competências e habilidades” e, com a prova, o governo quer “construir um indicador qualitativo que possa ser incorporado à avaliação de políticas públicas de formação inicial de docentes”.
Agora, depois do projeto já formatado e lançado, foi aberta uma consulta pelo site do MEC sobre quais assuntos o exame deve abordar, com o objetivo de balizar a matriz avaliativa a ser aplicada.
Infelizmente, esta é mais uma ação na qual o governo federal define uma política sem qualquer consulta às instituições formadoras ou às entidades representativas dos profissionais ou dos gestores. Mais grave ainda é quando isso ocorre logo após a Conferência Nacional de Educação (CONAE), que teve como um de seus principais assuntos a idéia da construção de um verdadeiro regime de colaboração. O MEC continua sendo autoritário na construção de seus programas, que, em sua maioria, incidem diretamente nas redes gerenciadas por estados e municípios.
Não há esforço de construção conjunta. O MEC simplesmente anuncia uma idéia e conclama os entes federados a aderir, mesmo que o alvo não seja algo de sua atribuição direta, como neste caso. Primeiro o governo faz publicidade da idéia e tenta conquistar a opinião pública, e depois pressiona Estados e Municípios a aderirem. É uma forma impositiva de consolidar políticas federais, tratando estados e municípios como parceiros de segunda categoria.
Além disso, a opção pela criação de mais um exame reforça um modelo baseado num sistema de avaliação em detrimento de um esforço real para a articulação de um Sistema Nacional de Educação. É a opção por políticas educacionais baseadas na competitividade e na indução, na qual a União não assume sua responsabilidade pelas questões educacionais.
Outra preocupação que surge é quanto ao uso desse exame, principalmente num momento em que surgem propostas que vinculam a progressão ou não dos professores em suas carreiras ao desempenho em exames isolados. Certamente a matriz de referência deste novo exame feito pelo MEC poderá ser facilmente utilizada para este fim, mesmo que essa não seja a intenção.
O discurso da meritocracia e da avaliação de desempenho esconde uma lógica mercantilista que tenta tratar a educação a partir de um modelo retirado diretamente do mercado e imposto às nossas escolas, e que coloca a educação numa perspectiva de produto a ser consumido e não mais como um direito social de todos e todas.
Essa preocupação se intensifica pela própria forma como o MEC trata o novo exame. Em entrevistas recentes, o ministro da Educação analisa que “há uma deficiência de instrumentos fidedignos [para avaliação dos professores no Brasil]. Uma matriz já ajudaria as instituições formadoras e os professores. Estamos procurando amadurecer essas questões para dar maior clareza do que se pretende na formação de professores”, dizendo também que “o ENADE, ainda que tenha sido nossa opção reformulá-lo, capta pouco daquilo que se quer captar da ótica do gestor que quer contratar o profissional de atuação adequada em sala de aula”.
Tais afirmações apontam para um objetivo de utilização desse exame para responder a questões relativas à formação de professores e não como um simples instrumento organizativo para facilitar o processo burocrático de contratação de professores, que lhe serve de justificativa. O MEC tenta remediar os efeitos da sua absoluta falta de controle sobre a qualidade das instituições privadas e dos cursos por elas oferecidos – resultado de uma política de expansão descontrolada do setor privado –, deixando mais uma vez a responsabilidade sobre os ombros dos professores.
Na perspectiva do ministro Fernando Haddad, “o papel do Ministério da Educação é fornecer instrumentos para que os estados consigam avaliar e melhorar seu corpo docente”, como se não houvesse qualquer responsabilidade do estado na formação destes profissionais.
É fundamental que o MEC discuta essa proposta de forma mais aprofundada com o conjunto da sociedade, e principalmente que se priorizem, nas ações do Ministério, o encaminhamento das diretrizes apontadas pela CONAE, caminhando para a estruturação de um sistema nacional de educação e rediscutindo o papel de cada ente federado. Assim, o poder público assumirá de fato sua responsabilidade pela garantia do direito à educação. É inaceitável que o INEP se torne apenas um órgão de elaboração e execução de exames e que esse seja o eixo central da política educacional do MEC.
Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal – PSOL/SP
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