Selic e dívida interna: cresce a remuneração do governo para os bancos e, com uma política irresponsável, a dívida interna pesa cada vez mais sobre o país.
Em recente artigo publicado pelo economista Paulo Kliass, esse levanta a questão do sentido e do real significado para a economia brasileira da tão falada taxa Selic, ou taxa básica de juros. Essa taxa é o que o governo paga aos bancos (notadamente) que lhe emprestam dinheiro comprando títulos da sua dívida interna.
A Dívida Interna Líquida do setor público, em abril de 2010, era de um trilhão e trezentos bilhões de reais e a Dívida Interna Bruta, que inclui governo federal, INSS, governos estaduais e governos municipais, atingiu a marca de um trilhão novecentos sessenta e oito bilhões de reais, segundo nota para a imprensa de 27/05/2010 do Banco Central do Brasil.
Com o último aumento da taxa Selic, de 9,5% para 10,25% ao ano, o governo vai gastar com a Dívida Interna Líquida um valor a mais de dez bilhões duzentos e setenta e cinco milhões de reais; já com essa mesma elevação de 0,75% da taxa básica de juros, a Dívida Interna Bruta chega aos 14 bilhões e 760 milhões de reais, tendo como fonte o Banco Central de maio de 2010.
Se computarmos somente esse percentual (0,75%) de aumento, que vai se somar ao total da dívida existente - aliás, o Banco Central já sinalizou que vai realizar novos acréscimos nesta taxa - só com este aumento no período de um ano, temos o seguinte: a Dívida Interna Líquida teria um aumento de 123 bilhões e 300 milhões de reais; já a Dívida Interna Bruta, em um ano, iria para 177 bilhões e 120 milhões de reais, tendo como fonte o Banco Central. O percentual da Dívida Interna Líquida em relação ao PIB de abril de 2010 é de 42,2%. O percentual da Dívida Interna Bruta em relação ao PIB também de abril de 2010 ficou na ordem de 60, 6 % (dados do Banco Central).
É realmente assustador, e ao mesmo tempo uma irresponsabilidade em termos de política econômica, o que o Banco Central tem praticado no nosso país.
Esta política monetária ortodoxa adotada há anos pela Autoridade Monetária tem representado uma sangria constante das finanças públicas e, ao mesmo tempo, uma satisfação incomensurável do sistema financeiro nacional, leia-se sistema bancário, especuladores internacionais e grandes empresas.
Os reflexos da elevação da taxa básica de juros não é somente nas contas públicas. Ela repercute em todos os níveis da sociedade brasileira. Programas como investimentos públicos, infra-estrutura, ações sociais, saúde, educação, habitação, entre tantos, são diretamente afetados.
A política de responsabilidade fiscal se tornou uma camisa de força na qual o governo se vê obrigado a se enquadrar dentro de limites restritivos - draconianos - das metas fiscais, acarretando com isto um engessamento e mesmo paralisia administrativa em todas as esferas de sua atuação. Qualquer política econômica ou programa de desenvolvimento, mesmo dentro dos limites e necessidades dos interesses do capitalismo nacional, fica praticamente inviabilizado. O que se tem praticado é uma verdadeira selvageria e aqueles que combatem o capitalismo percebem que, no final, quem paga a conta são os trabalhadores, mesmo que essa afirmativa pareça esdrúxula, estapafúrdia.
O Banco Central, na atualidade, já atua de forma independente, mesmo que formalmente isso ainda não esteja estabelecido. As grandes empresas do setor produtivo também usufruem das benesses da taxa Selic, pois seus setores financeiros aplicam vultosos recursos na compra de títulos do governo.
Outro reflexo é na taxa de câmbio, que atrai especuladores do mundo inteiro devido às altas taxas de juros, forçando a valorização do real. Este fato é dito por Kliass: "Como o financiamento da dívida pública depende bastante dos recursos externos, as nossas autoridades econômicas terminam por elevar o nível dos juros para manter atrativa a alternativa para os grandes operadores do mercado financeiro internacional de aplicar seus recursos em títulos no mercado brasileiro."
Outro lado da questão é que as altas reservas cambiais do governo são aplicadas, notadamente, em títulos norte-americanos, que têm baixíssimas remunerações, ou seja, o governo brasileiro pratica uma política financeira às avessas, remunera os especuladores no Brasil com as maiores taxas do mundo e ao mesmo tempo aplica, financiando os Estados Unidos, obtendo insignificantes retornos financeiros.
O que foi dito aqui, que não contempla em toda a sua amplitude o assunto, mostra claramente que a política econômica brasileira estabeleceu para si uma imensa armadilha financeiro-econômica de base ortodoxa, de cunho recessivo e de insustentabilidade econômica.
Este encalacramento, em que está envolta a política econômica do país, na verdade tem obedecido fielmente aos ditames do famigerado neoliberalismo, que, apesar de tudo que representou e representa, continua com muitos adeptos no mundo do capital.
Não me alongando mais, tanto FHC como Lula praticaram e praticam uma política econômica de cunho liberalizante, em que o primeiro realizou um desmanche completo da economia brasileira e o que restou para Lula foi administrar, aparando aqui e acolá as mazelas do capitalismo nacional com pitadas de uma política econômica-social de contenção, de "reconstrução" e ao mesmo tempo cooptação dos movimentos sindicais e populares.
"É pau, é pedra, é o fim do caminho..."
Ari de Oliveira Zenha é economista
26 de jul. de 2010
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