Depois de chamar os senadores de "ladrões" e "corruptos", o senador Mário Couto (PSDB-PA) voltou nesta quarta-feira (31) à tribuna do Senado para desafiar os colegas a cassarem o seu mandato.
Cobrado por um grupo de senadores a divulgar os nomes de quem são os "ladrões" na Casa, Couto se recusou a apontar quem seriam os parlamentares que enriqueceram de forma ilícita.
"Dizer nome, nem preciso. Não citei nomes pelas regras do regimento interno, não por covardia. Se quiserem me cassar, cassem. Isso é coerência de um senador que quer limpar essa Casa. Não me permito conviver aqui com senadores que sei que a desigualdade econômica é muito alta em relação a outros que vivem com dificuldade, como eu", afirmou.
Couto fez discurso depois que os senadores Eduardo Suplicy (PT-SP), Ana Amélia Lemos (PP-RS) e Pedro Taques (PDT-MT) pediram no plenário para o tucano listar quem seriam os "ladrões".
"A imunidade parlamentar pressupõe responsabilidade. Nós já sofremos muito nessa Casa. Sangramos esse ano com a cassação de mandato de um colega, e eu penso que enxovalhar generalizadamente a Casa e a instituição não é um bom serviço", disse Ana Amélia.
O tucano prometeu encaminhar ofício ao STF (Supremo Tribunal Federal) com pedido para a corte "desengavetar" processos contra deputados e senadores. Couto disse que as "baratas do STF vão roer folha por folha dos processos" porque estão há anos parados para análise do tribunal.
"Julguem com bastante rapidez esses processos que há mais de três, cinco anos, se encontram lá. Essa é a grande hora de aproveitarmos", disse.
Couto chegou a trocar farpas com a senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM), que presidia a sessão. Ao ser citado por Ana Amélia, pediu a palavra e bateu boca com a senadora amazonense até conseguir falar --já que Vanessa ocupava a presidência do Senado no momento dos discursos.
Couto foi eleito em 2006 para o Senado, quando declarou à Justiça Eleitoral patrimônio de 598,8 mil. Apesar das críticas aos colegas, ele é alvo de inquérito no STF por suspeita de crime eleitoral.
Segundo o site Transparência Brasil, ele também é alvo de ações civis públicas para ressarcimento de danos ao erário e por improbidade administrativa.
LADRÕES
Em discurso ontem no plenário, o tucano disse que tem vontade de "cuspir na cara" de alguns senadores que enriqueceram "sem nunca terem sido nada na vida".
"Tem homem que dá vontade de cuspir na cara, porque eu sei que está aqui a penas duras do povo, que estão ricos porque roubaram a nação, o povo. Aproveitem, ministros do Supremo, limpem o Congresso Nacional. Vejam o patrimônio de cada senador. Não engavetem os processos desses ladrões que estão aqui", afirmou.
Sem citar nomes, Couto disse que há senadores que têm jatos particulares, casas luxuosas e "50 mil bois no pasto" sem condições de comprovar o seu patrimônio. "Eles estão livres, andando dentro do parlamento, fazendo projetos perto de todos os outros senadores", disse.
Grazziotin e a senadora Lídice da Mata (PSB-BA) pediram que a Mesa Diretora do Senado tome providências contra o senador.
FONTE: FOLHA.COM
Stéfano Santagada
- A recente divulgação de uma carta de índios Guarani-Kaiowás, interpretada como ameaça de suicídio em massa, não foi a primeira polêmica envolvendo representantes da tribo. Antes de publicar em redes sociais o texto que cita a "morte coletiva" dos índios diante de uma suposta determinação judicial para que deixem uma área no Mato Grosso do Sul, os Kaiowás integraram protestos em outros estados brasileiros.
Na semana passada, os indígenas estiveram em São Paulo e Altamira (PA) - a cerca de 3 mil km do Mato Grosso do Sul -, protestando contra a construção da Usina de Belo Monte. No último dia 19, participaram de ato na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, em favor dos povos indígenas brasileiros.
O coordenador regional do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no Estado, Flávio Vicente Machado, afirma que existem "redes de articulação" entre lideranças indígenas para a organização destes atos. Segundo ele, os deslocamentos são custeados com recursos próprios e, em alguns casos, pelos organizadores dos eventos.
A mais recente e reverberante manifestação pública foi contra a reintegração de posse de uma área ocupada pelos Kaiowás em Iguatemi (a 450 km de Campo Grande), disputada com fazendeiros desde 2002. Na carta, eles afirmaram que o despejo dos moradores da aldeia significaria decretar a morte dos 170 índios, incluindo 70 crianças.
O anúncio da liminar foi feito na semana passada, mas na última sexta-feira, a Justiça sul-matogrossense esclareceu que a liminar é para a manutenção da posse, e não reintegração. Ou seja, os índios podem permanecer na área enquanto a questão não é resolvida.
A situação, no entanto, chamou atenção para conflitos envolvendo a etnia Guarani-Kaiowás, o segundo maior agrupamento indígena do Brasil. Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), são cerca de 45 mil pessoas da etnia espalhadas em pequenas áreas, principalmente, no sul do Estado de Mato Grosso do Sul.
De acordo com a Funai, a disputa em Pyelito Kue "não é um caso isolado". "Comunidades Gurani-Kaiowá de toda a região enfrentam graves problemas e ameaças à vida", diz a entidade, em nota.
Para Flávio Vicente Machado, os constantes conflitos por terra entre índios e fazendeiros têm provocado o aumento da violência nas comunidades. "A situação chegou a esse ponto devido à omissão do Estado brasileiro. A carta (da comunidade Pyelito Kue) traz o anseio de todo um povo, um povo que está sendo assassinado pela omissão do governo", diz. "Os algozes dos índios estão no Mato Grosso do Sul e em Brasília", conclui.
Conforme o Cimi, estudos comprovam que a etnia viveu na região até a década de 1920, quando a expansão agrícola começou a expulsar os índios do local. O processo se acentuou há cerca de 40 anos, com a introdução das lavouras de soja na localidade. "Há farta documentação que comprova a ocupação histórica dessa região pelos Kaiowás", defende Machado.
Para ele, desde então, houve um "confinamento" de índios em pequenas comunidades. Segundo o coordenador, a retomada das terras pelas comunidades indígenas se iniciou apenas na década de 1980. A partir daí, contudo, ocorreu um forte aumento no número de assassinatos de lideranças e conflitos entre índios e agricultores.
"O Mato Grosso do Sul é rico, e a nossa situação é de violência e precariedade. Estamos apenas lutando pelo nosso direito. O nosso futuro está na nossa terra e o governo tem que respeitar o nosso espaço. É para isso que lutamos", afirma o vereador Otoniel Ricardo (PT), da cidade de Caarapó (MS), membro do conselho da Aty Guasu, que representa os Guarani-Kaiowás.
Em manifesto publicado pelas redes sociais, a Aty Guasu afirma que a etnia se encontra em processo de "genocídio". "Esses fatos levam os índios ao estado de desespero e medo. Por isso, pensam em resistir e reagir, para morrer todos juntos", disse o grupo.
Suicídios
Diante da repercussão da carta da comunidade Pyelito Kue, entidades e lideranças indígenas negaram que o texto anuncie um "suicídio coletivo" no local. Segundo o vereador Otoniel, a mensagem foi mal interpretada pela população. "Não é verdade. Isso não vai acontecer. Suicídio é um tema muito pesado para nós", disse.
Em comunicado, a Aty Guasu também refutou os rumores. "Os Kaiowás falam em morte coletiva no contexto da luta pela terra, ou seja, se a Justiça e os pistoleiros contratados pelos fazendeiros insistirem em tirá-los de suas terras tradicionais, estão dispostos a morrerem todos nela, sem jamais abandoná-las".
A despeito das negativas, os suicídios têm se tornado prática comum nas comunidades Kaiowás. Segundo dados do Cimi, a cada semana um jovem da etnia tira a própria vida - nas últimas três décadas foram mais de 1,5 mil casos. Relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgado em 2010 afirma que a taxa de mortes do tipo entre Kaiowás foi 19 vezes maior que a média nacional na década passada. A maioria dos casos ocorreu entre jovens na faixa dos 15 aos 29 anos.
Mesmo com o alto índice, o coordenador do Cimi na região afirma que o suicídio não é uma característica do grupo indígena. "Não é cultural, não há registros disso na antropologia", diz. Segundo ele, os casos são uma consequência da "falta de perspectiva de se viver no próprio território".
FONTE: JB.COM